quinta-feira, 25 de outubro de 2012

0 O sentido do “novo” nas eleições municipais no ES

Desde o final do primeiro turno das eleições municipais paira uma inquietude em alguns setores da sociedade que buscam refletir sobre esse fenômeno da “mudança”, o tal discurso do “novo” que se abateu com intensidade e convenceu o eleitorado, principalmente nos municípios da Grande Vitória.

A população levou ao 2º turno dessas eleições em municípios expressivos candidatos que não tem projeto nem programa para essas respectivas cidades, eles passaram para a segunda etapa do pleito apenas transmitindo a imagem de que representam uma ruptura com o passado e estão dispostos a construir o que eles publicitariamente consideram ser o “novo”.

E não apenas esses, mas também os “velhos” políticos, abatidos pela mesma onda, foram obrigados a embarcar nessa fantasia fetichista, para oportunamente tentar convencer o eleitorado de que também representam ideias modernas, novas e capazes de romper com as já consagradas práticas retrógradas que permeiam determinados clãs da política capixaba, dos quais eles mesmos são parte.

Numa análise mais criteriosa do processo, que implica em identificar também certas características da sociedade contemporânea, tendo em vista que as pessoas em tese fazem escolhas a partir do arcabouço cultural, sua visão de mundo e seus valores, é possível identificar traços que podem explicitar de maneira mais objetiva esse desejo da “mudança”, essa busca fugidia pelo “novo”, que não representa em si um valor.

A eleição se transformou num jogo de marketing, no qual os políticos passaram a ser vendidos como um produto, sendo oferecidos aos eleitores, assim como se oferece um celular, um carro ou um apartamento. A política é negociada com as mesmas ferramentas, estratégias e jargões do marketing comercial.

A maioria dos candidatos apresentam programas de governo que mais se parecem cartas de intenção, demonstram total inabilidade para estruturar as ideias ou mesmo defender um projeto articulado e bem definido para a cidade, restando a esses apenas o convencimento através de estratégias simplistas e rasas, a exemplo de musiquinhas chicletes que se tornaram hits. Em resumo, a “marketização” das campanhas tem confirmado a tese de que as disputas eleitorais estão cada vez mais esvaziadas e despolitizadas, com pouquíssimas oportunidades para o debate franco e aberto de ideias e projetos, que deveriam apontar soluções factíveis para os reais problemas que as cidades enfrentam.

Se a política é oferecida como um produto, o que resta ao eleitor se não reproduzir o comportamento de consumidor já tão arraigado e familiar ao seu cotidiano? Como se comportam os consumidores? O que os mobiliza? Com que se identificam? Como fazem suas escolhas? A partir de quais critérios?

Numa sociedade de consumidores o apelo ao novo é um imperativo. Há um desejo latente, um “apetite insaciável pela novidade”, um querer fugaz que rapidamente dilapida, destrói e consome a política-produto, tornando-a obsoleta e ultrapassada num piscar de olhos, mesmo quando esse novo não se sustenta a uma análise mais profunda, quando ele não passa de um clichê, de um fetiche mercadorizado, superficial e fútil. É a urgência da descartabilidade irresponsável!

Sobre a famigerada “mudança” ela é mais uma das características fundantes da sociedade moderna. Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, autor de “Modernidade Líquida”, conceitua os seres modernos como aqueles que estão unidos em torno de formas de vidas marcadas pela fragilidade, fugacidade, e desejo de câmbios constantes.

 O desejo de mudança expresso nessas eleições não nos conduzirá a uma “nova ordem”, nem a novas práticas políticas, muito menos ao que há de realmente novo na política brasileira: fortalecimento do estado, respeito à diversidade humana, justiça social, gestão democrática, políticas públicas consistentes, foco nas políticas sociais para o desenvolvimento humano e o cuidado das pessoas.

Apesar de espalharem a célebre frase “as pessoas têm medo das mudanças. Eu tenho medo que as coisas nunca mudem”, a história de vida desses candidatos advogam contra eles, pois denunciam que ao contrário do que em período eleitoral propagam, eles têm servido mais como reprodutores do status quo, do que de fato agido para que mudanças substanciais e estruturais aconteçam.

Infelizmente, as opções que aí estão representam grupos já consolidados na política capixaba, que têm sistematicamente feito oposição às políticas públicas progressistas. Ao mesmo tempo em que defendem eficiência e modernidade, praticam o clientelismo, fazem joguetes políticos, são parte do projeto neoliberal em curso no Espírito Santo, capitaneado pelo ES 2025, que tem colocado à margem o interesse público da ampla maioria da população dessas cidades e desse estado.

A escolha desse “novo” dialoga mais com um desejo volátil e efêmero, evasivo e caprichoso de mudar por mudar, “um desejo que tem a si mesmo como objeto constante, e por isso mesmo está fadado a permanecer insaciável” (Bauman, 2001). Os eleitores-consumidores, movidos apenas por esse desejo fugaz, quando alcançam a coisa desejada são surpreendidos pelo sentimento de perda de valor,  de perda de sentido.  Como diz Bauman, “a chegada, o fim definitivo de toda escolha, parece muito mais tediosa e consideravelmente mais assustadora do que a perspectiva de que as escolhas de amanhã anulem as de hoje. Só o desejar é desejável – quase nunca sua satisfação”.

O pior é quando tomarem consciência de que o produto novo que acabaram de adquirir, não passa de propaganda enganosa, de uma embalagem vultosa aos olhos e aos sentidos, mas vazia e rasa de propósitos que visem uma mudança real de valores e de sociedade.



Por Wanderson Mansur – jornalista e membro da AE/PT no ES



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